“Não existe política de direitos humanos sem orçamento. O resto é fantasia. Fantasia perversa, que faz as pessoas acreditarem em coisas que nunca vão se realizar. Peço a todos e todas que tenham em mente que a luta pelos direitos humanos é uma luta no campo da economia política, no campo financeiro-orçamentário.”
Com essas palavras, o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, abriu a 5ª Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que começou neste domingo (14) e vai até quarta-feira (17).
Além de pedir mais recursos para os direitos humanos, Silvio Almeida garantiu que o governo federal está aberto ao diálogo com todos os governadores para implementar o plano Novo Viver sem Limite , lançado em 2023. Com R$ 6,5 bilhões em investimentos de diversos ministérios em 95 ações em todo o país, o Novo Viver sem Limites tem, até agora, a adesão de cinco estados: Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba e Piauí. Rio Grande do Norte, Espírito Santo, Alagoas e Pará estão em processo de adesão.
“O Novo Viver sem Limite depende dessa repactuação depois do que nos devastou nos últimos anos. Nós vamos conversar com todos os governadores e governadoras que queiram fazer da política de direitos humanos e de pessoas com deficiência uma realidade. Não quero saber de que partido é. Se é governador, nós vamos conversar. Não haverá nenhum óbice do governo federal para a implementação das políticas públicas”, declarou o ministro.
Presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados, o deputado Weliton Prado (Solidariedade-MG) se disse comprometido com a criação do Fundo Nacional para as Pessoas com Deficiência. “Nossa prioridade máxima na Câmara dos Deputados é garantir o Fundo Nacional para as Pessoas com Deficiência. Isso é fundamental. Temos fundos para a Criança, os Idosos. Temos que garantir um fundo para garantir que as políticas para as pessoas com deficiência saiam do papel”, destacou.
O parlamentar lembrou que a comissão aprovou um fundo de 0,5% dos prêmios de loteria para as Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae). “A gente está tentando aprovar no Plenário da Câmara para que isso vire lei”, ressaltou.
Ele citou como desafios conjuntos do governo federal e da Câmara dos Deputados o mapeamento das pessoas com deficiência, com a unificação nacional dos cadastros, o aumento do limite de renda per capita por família para receber Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a regulamentação da avaliação biopsicossocial do Novo Viver Sem Limites.
Com 1,2 mil participantes de todo o país, a 5ª Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência marca a volta desse tipo de evento depois de oito anos. O encontro é resultado de 453 conferências municipais, 51 conferências ou fóruns regionais, uma conferência livre de acessibilidade cultural e 27 conferências realizadas em todas as unidades federativas.
A ativista Maria da Penha, que batizou a lei de combate à violência contra a mulher após ficar paraplégica por um ataque do então marido, participou do evento de abertura por meio de um vídeo. Ela recordou que os desafios para assegurar os direitos das pessoas com deficiência são antigos.
“No início da minha paraplegia, participei aqui em Fortaleza da militância da causa das pessoas com deficiência. Dentre outras conquistas, como a dos transportes públicos acessíveis, conseguimos, no fim da década de 80, que os lesados medulares recebessem os insumos para a realização do cateterismo vesical e garantissem a não perda da função renal”, lembrou.
Maria da Penha destacou a falta de acessibilidade em meio às viagens pelo país após a sanção da lei, em 2006. “Com o advento da Lei Maria da Penha, comecei a viajar por todo o Brasil. Quando necessário, eu mencionava as falhas sobre acessibilidade encontradas naquela cidade. Em uma das minhas primeiras viagens, ao chegar depois da meia-noite no hotel, não consegui entrar no apartamento porque a porta de entrada era estreita demais. Aguardei um longo tempo até encontrarem um outro hotel disponível”, relembrou.
Vice-presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade), Décio Gomes Santiago destacou que a luta para garantir os direitos da categoria vem de décadas. “A geração de ouro [das pessoas com deficiência] não tinha ponto de negociação. Essa geração, na Constituição de 1988, conseguimos colocar um artigo para as pessoas com deficiência sem nenhum deputado federal, junto com toda a sociedade civil”, frisou.
A secretária nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, Anna Paula Feminella , recordou que os próprios participantes da conferência enfrentaram desafios para virem a Brasília.
“Saímos dos nossos territórios, das nossas famílias, das nossas instituições. Saímos de barco, saímos para uma situação de incerteza. Isso exigiu de muitos de nós muito esforço, muita audácia também. Muitos de vocês vieram de barco, de balsa, de ônibus, de bicicleta, de avião e, nessas viagens, encontraram muitas pessoas que ficaram surpresas em nos ver a caminho de Brasília”, destacou.
Além da implementação do Novo Viver sem Limite, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania listou ações a serem adotadas pelo governo federal. Em breve, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinará decreto que regulamentará a instituição do cordão de girassóis para a identificação de pessoas com deficiências ocultas. Outro decreto criará o Sistema Nacional de Cadastro da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, para facilitar a emissão da carteira nacional de identificação desse segmento da sociedade.
O ministério também prometeu ampliar a cooperação com organismos multilaterais para garantir os direitos das pessoas com deficiência. A pasta também abrirá uma consulta pública sobre o 4º Relatório Nacional sobre o Cumprimento da Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas com Deficiência.
Por fim, uma portaria conjunta dos Ministérios dos Direitos Humanos e da Cidadania e da Gestão e Inovação em Serviços Públicos estabelecerá os procedimentos para melhorar a acessibilidade em prédios públicos.
O evento está sendo realizado com todos os cuidados para garantir o entendimento pelas pessoas com deficiência auditiva e visual. Após a exibição do vídeo do Hino Nacional na abertura, um grupo de intérpretes executou a versão do Hino na Língua Brasileira de Sinais (Libras), com um pedido para que o público não ficasse de pé em respeito aos cadeirantes.
Os demais números musicais, a execução de Asa Branca pelo sanfoneiro Luzico do Acordeon e duas canções do rapper brasiliense Felipe Costa, que tem parte da perna direita amputada, também foram interpretadas em Libras. Antes da exibição do vídeo de Maria da Penha, uma voz relatou a audiodescrição do cenário. Todos os discursos têm intérpretes em língua de sinais.
Na segunda-feira (15), palestras abordarão os cinco eixos temáticos da conferência. As discussões pretendem fortalecer a construção de políticas públicas inclusivas e assegurar os direitos das pessoas com deficiência no Brasil.
Os cinco eixos temáticos são os seguintes:
• Estratégias para manter e aprimorar o controle social assegurando a participação das pessoas com deficiência;
• Garantia de acesso das pessoas com deficiência às políticas públicas e avaliação biopsicossocial unificada;
• Financiamento da promoção de direitos da pessoa com deficiência;
• Cidadania e Acessibilidade;
• Os desafios para a comunicação universal.
A terça-feira (16) será dedicada ao aprofundamento dos debates sobre os eixos temáticos pelos grupos de trabalho. A plenária final será realizada no último dia, na quarta-feira, seguida pela apresentação da Carta de Brasília. O encerramento da conferência está previsto para as 17h.
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